segunda-feira, 30 de junho de 2025

L’Enfance Éternelle

 A história da L’Enfance Éternelle começa de forma quase mítica: a banda foi formada em novembro de 1983, em Lyon, antes mesmo de ter ensaiado ou composto uma única música, já havia um show agendado. Essa urgência criativa refletiria toda a trajetória do grupo um dos nomes mais inquietos e apaixonantes da cena pós-punk francesa dos anos 1980.

O nome da banda (“A Infância Eterna”) evoca tanto uma angústia existencial quanto uma recusa em amadurecer sob os moldes do mundo capitalista e convencional, tema que ecoa em suas letras e atmosferas densas. L’Enfance Éternelle logo conquistou espaço nas programações alternativas da televisão francesa, com destaque para sua segunda aparição na FR3 (atual France 3) em setembro de 1985.  No mesmo período, lançam uma fita demo com quatro faixas, prensada em 500 cópias rapidamente esgotadas, consolidando o interesse crescente por seu som sombrio, melódico e fortemente emocional.

O primeiro álbum surge de uma apresentação intensa no dia 17 de maio de 1986, na Bourse du Travail, em Lyon. O evento, batizado de Jour des Fous (“Dia dos Loucos”), reuniu cerca de 1.200 pessoas um número expressivo para a cena alternativa da época. A apresentação, dividida com a também cultuada banda Gestalt, foi registrada ao vivo e transformada em um disco que capturou a visceralidade das performances da L’Enfance Éternelle. 

Entre setembro e dezembro de 1988, a banda entra em estúdio para gravar seu segundo e mais ambicioso trabalho: La Terre des Innocents. O lançamento oficial ocorre em 15 de abril de 1989, no clube Le Truck, novamente com público de mais de mil pessoas. Dividem o palco com velhos camaradas da cena fria francesa: Opéra de Nuit, outra banda que se tornou ícone cult do darkwave nacional. 

Em 1990, o grupo inicia a gravação de uma nova demo nunca finalizada. Esse material inacabado marca o fim da trajetória da L’Enfance Éternelle, que encerra suas atividades em dezembro daquele ano. Cada integrante, no entanto, seguiu caminhos musicais (e artísticos) diversos, reforçando a pluralidade do núcleo criativo do grupo: 

Bertrand "Cheap" seguiu com projetos como Bob’s Your Uncle e o experimental The Camelia Street Blury Experiment, ambos sediados em Paris.Fabrice Della-Malva e Jérôme “Dien” Bideaux mergulharam no hardcore com a banda Garlic Frog Diet, mais agressiva e politizada. Christophe Neau optou por misturar jazz e rap no projeto Lex Léo.

DJ Pee (Pat) fundou a hoje conhecida banda Le Peuple de l’Herbe, misturando dub, hip hop e eletrônica. Seu irmão Kriss tornou-se engenheiro de som e produtor de shows, com grande reconhecimento. Franck “Kreppux” se voltou ao teatro e à música popular francesa. Pascal “Bô Mouton” Prenez, fotógrafo da banda, tornou-se ativo no sindicalismo.Jérôme Margotton fundou a banda de acid jazz Mo’ Jazz Beats, antes de iniciar o projeto mOko. Denis Lecarme trilhou caminho na canção francesa com o projeto L’Orchestre de Poche e atualmente segue carreira solo.

Apesar de sua curta existência, L’Enfance Éternelle deixou marcas profundas. Seu som é uma síntese do pós-punk europeu com traços muito próprios da cena de Lyon, melancólico, teatral e repleto de lirismo. A banda trafegava com naturalidade entre guitarras vibrantes, atmosferas melódicas e uma poética profundamente afetiva. Influenciada por Joy Division, Xmal Deutschland e os sons mais soturnos da new wave francesa, a banda ajudou a consolidar uma identidade para o darkwave nacional. 

Se hoje seus discos são itens cultuados e buscados por colecionadores, sua herança permanece viva não apenas nas gravações, mas nos inúmeros projetos artísticos que cada ex-integrante desenvolveu. L’Enfance Éternelle foi uma estrela fugaz, mas intensa  

Le Jour Des Fous, Primary, 1 of 5